domingo, 10 de janeiro de 2016

Apóstolo emergente das igrejas neopentecostais promete apagar a memória dos fiéis


Numa incansável cruzada por arrecadação, o autointitulado apóstolo Agenor Duque, da Igreja Plenitude do Trono de Deus, pede à plateia que raspe a carteira e que doe até o décimo terceiro salário. Já anda de Porsche e voa de jatinho, é mole ou vc quer mais? Do alto do púlpito, diante de cerca de 7 mil fiéis com as quer mais?. cabeças cobertas por um pequeno pano avermelhado, um homem vestindo uma roupa que imita estopa aponta o dedo para um rapaz da plateia: “Você é homossexual?”, diz ao microfone. Ao ouvir uma resposta afirmativa, continua: “E você quer sair do homossexualismo?”. O interlocutor diz que sim, e é convidado a subir no altar. Enquanto uma canção entorpecente embala a cena, o líder espiritual cerra os dois punhos, ergue os braços e grita: “No milaaaagre de Manassés, Deus apaga da memória agora todo o passado de sofrimento. No milaaaagre de Manassés, Deus faz a pessoa esquecer que um dia foi homossexual”. Volta a se dirigir ao rapaz. – Seu nome? – Junior. – Você tinha alguma vida errada no passado? – Não. – Pensei que você era gay... Pensei que você morava com um homem... – Não, Deus me livre. Como que num passe de mágica, Junior diz que nunca gostou de homens. Na semana seguinte, volta ao mesmo altar para contar o desfecho de sua história. Diz que seu namorado, ao saber da conversão, caiu no choro. A mãe, surpresa com o esquecimento súbito, cogitou levar o filho a um hospital. Entre gritos entusiasmados de “aleluia” e “eu creio”, o público se levanta e aplaude a transformação. O homem das vestes de saco – um figurino para demonstrar humildade diante de Jesus Cristo – é o autoproclamado apóstolo Agenor Duque, um paulistano de 37 anos, filho de pais separados, crescido numa família pobre da Zona Leste de São Paulo, ex-viciado em drogas. No concorrido mercado das igrejas neopentecostais, Duque é o pastor emergente do momento. Com uma forte vocação teatral e adepto da prática de prometer o impossível, Duque abocanha cada vez mais fiéis e começa a incomodar as igrejas concorrentes. Além das usuais curas de doenças e vícios, Duque promete apagar o passado da mente dos fiéis. Não hesita em abusar de condutas preconceituosas, como propagar o “milagre” de fazer um homem esquecer a homossexualidade ou enfrentar num duelo um suposto adepto do candomblé. Prova de sua destreza para lotar igrejas e influenciar opiniões, o deputado e pastor Marco Feliciano não sai do altar da Igreja Apostólica Plenitude do Trono de Deus*. Na campanha eleitoral do ano passado, o tucano Geraldo Alckmin, reeleito governador de São Paulo, ajoelhou-se no púlpito de Duque. Num roteiro já conhecido entre os pastores das neopentecostais, Duque começou na Igreja Universal do Reino de Deus e migrou para a Mundial – até que teve uma “visão espiritual” e decidiu criar seu próprio templo. Em setembro de 2006, abria a porta da Igreja Plenitude do Trono de Deus. Com R$ 25 mil da venda de um Astra, Duque comprou algumas poucas horas nas madrugadas de rádios e alugou um galpão na Avenida Celso Garcia – que, pela facilidade de acesso e circulação intensa, concentra boa parte das igrejas neopentecostais. Há dois anos, Duque tinha cinco modestas igrejas em São Paulo. Hoje, são pelo menos 20, espalhadas por São Paulo, Amazonas, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Goiás e Distrito Federal – sem contar as dezenas de núcleos, galpões abertos pelo interior que, ainda sem documentação, não são considerados templos. No ano passado, a Igreja Plenitude do Trono de Deus firmou uma espécie de joint venture evangélica com a igreja de André Salles, o líder evangélico responsável pela conversão da ex-senadora Marina Silva, para aportar em Brasília. Em dois anos, a Igreja Plenitude do Trono de Deus saltou de quatro para 18 horas no canal de televisão RBI. Só entre outubro e novembro, passou de quatro para mais de nove na Rede Brasil TV. >> “Deus me revelou que Marina será a próxima presidente”, afirma o pastor que converteu a candidata O traje de saco nos cultos é uma espécie de abadá para uma encenação de pobreza. Há tempos Duque deixou a dureza para trás. Como os adeptos do funk ostentação, fora do palco ele se enfeita com cordões, anéis e relógios dourados, bonés e tênis de marcas como Nike e Hugo Boss e adora exibir-se no Instagram. Dirige um Porsche e um BMW. Já se exibiu em um vídeo com uma Ferrari – após críticas de internautas, recuou e disse que o carro era de um “amigo”, o pastor Arthur Willian Van Helfteren, da Igreja Universal do Reino de Deus. Sempre que viaja, Duque evita apertar o corpanzil nas poltronas da aviação comercial; prefere o conforto de um bimotor Cessna Citation. De acordo com os registros da Agência Nacional de Aviação Civil, a aeronave pertence à Cimeeli Comércio e Indústria, uma empresa sem rastro. O telefone atribuído à Cimeeli é residencial e seus sócios não foram localizados. Em um universo em que não faltam exageros, os cultos de Duque são espetáculos ainda mais histriônicos. Ele atua em parceria com a mulher, a autointitulada bispa Ingrid Duque, e mais recentemente com o filho adotivo, o pastor Allan. Em suas performances, Agenor Duque intercala suas falas com expressões incompreensíveis que diz virem da língua do Espírito Santo – “Traz o óleo, quibalamacia balabaliã”, diz, em meio ao culto, enquanto checa mensagens no telefone. Suas orações quase sempre terminam com um “hallelujah”, num esforçado sotaque americano. >> A força dos evangélicos “A religiosidade brasileira sempre foi muito sincrética. O brasileiro valoriza tudo o que o ajuda a se relacionar diretamente com o sagrado”, afirma Rodrigo Franklin de Sousa, professor de pós-graduação em ciências da religião da Universidade Presbiteriana Mackenzie. “O teatro cai como uma luva.” Os cultos da Plenitude do Trono de Deus reúnem dramas humanos de todos os tipos. Há mulheres traídas pelo marido, fiéis com pendências com a Justiça, mães desesperadas para tirar o filho da prisão, pais de família desempregados, viciados que tentam resgatar a dignidade. Converter os dramas em espetáculo e gerar lucro requer organização. Nos cultos de domingo, mais lotados, a igreja é dividida em quadras imaginárias, cada qual vigiada por um pelotão de obreiros. Numa cerimônia, um homem se exaltou e foi contido por seguranças. Curiosa, parte da plateia foi repreendida pelos obreiros: “Deus está no altar lá na frente. Parem de olhar para o lado”. http://epoca.globo.com/ Na foto veja ai o partor Agenor duque, o pastor André Salles e a bispa Ingrid Duque